Em que medida e de que maneiras os ciganos, ou os romá como eles mesmos preferem dizer, poderiam estar inseridos na criação da cultura popular brasileira? Como estão inscritos no imaginário e na memória no Nordeste, do Brasil Central, do Rio de Janeiro? Este livro do baiano Alexandre José de Morais Filho (1844-1919), publicado em 1885 pela Garnier, do Rio, procura começar a formulação dessas questões, a partir da compilação em português dos poemas antigos e tocantes que o cigano canta acompanhado da viola. São peças líricas, elegias e poemas fúnebres, o eco de uma cultura milenar que persiste no mundo muito mais como o patrimônio de um espírito coletivo do que como o registro preciso de uma história — não existe um consenso sobre qual a origem do povo cigano, embora a sua bandeira mundial faça referência à Índia, e a despeito de estar disponível o longo relato de perseguições e até de genocídios de que os ciganos foram alvo.
Neste livro encontramos parte do cancioneiro calom, isto é, da comunidade cigana brasileira originária da Ibéria, neste caso habitando o bairro da Cidade Nova, que existia na região central do Rio de Janeiro no séc. XIX; a comunidade calom chegou aí a ser próspera, até mesmo influente na economia (alguns enriqueceram vendendo africanos escravizados) e no sistema judiciário. O autor aproximou-se dessa coletividade com o objetivo de conhecer o homem na sua naturalidade e o corpo dos seus usos e costumes; aprendeu o dialeto calom e pôs-se a fazer as versões brasileiras das quadras.
Morais Filho foi um poeta, um homem interessado na cultura brasileira segundo a vontade de produzir uma poesia nacional e movido pela demanda, que rendeu as mais interessantes discussões na sua época, sobre a necessidade de estabelecer um conhecimento humanístico real acerca do país, com a ideia de que as grandes questões de antropologia e cultura deveriam ser estabelecidas. Morais Filho foi também folclorista, médico e cronista. Contra a escravidão, pretendeu abordar a associação entre o cativeiro do indígena e o do negro, com os livros de poesia Escravos vermelhos e Escravos negros, embora o seu interesse maior pareça ter sido pelos estudos culturais: foi o autor de um curso de literatura, em grande medida associado aos esforços de Sílvio Romero por criar uma história da literatura brasileira.
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